FPLCEM


Edição nº 130 - de 15 de Março de 2013 a 14 de Abril de 2013

Olá Leitoras! Olá Leitores!

Como ajudar clientes, amigas, colegas, funcionárias, ou vizinhas vítimas de violência doméstica?

Agir na orientação das mulheres que estão próximas de nós em muitas situações profissionais, nas relações de amizade ou clientela é um ato de solidariedade e meios de combater a violência. A vítima esconde humilhada a situação que vive, além de estar atemorizada por ameaças contra si ou filhos etc. Observar os sinais e incentivar a buscar o apoio e o socorro é o meio mais prudente para não se tornar omisso diante de violências continuadas que poderão se transformar em situações fatais.

Assim buscando colaborar para que você tenha a boa vontade em colaborar sugerimos que divulgue em sua empresa, escritório, consultório, igreja, associação de bairro, mercados e lojas, academias etc. a Central de Atendimento à Mulher – Ligue 180, a qual orienta, acolhe e encaminha para os serviços da rede especializada, mulheres vítima de violência, além de receber denúncias.

Desde já agradecemos a sua colaboração, complementamos com mais informações, entregando-lhe a edição nº 130 com notícias e pesquisas que fizemos para você. Fraternal abraço de Elisabeth Mariano.

Mais informações em combate a violência contra as mulheres

A rede de atendimento às mulheres em situação de violência está em constante ampliação. Hoje, são 220 Centros Especializados de Atendimento a Mulher; 72 Casas Abrigo; 92 Juizados/Varas Especializadas de Violência Doméstica; 29 Núcleos Especializados do Ministério Público; 59 Núcleos Especializados da Defensoria Pública; e 501 Delegacias Especializadas no Atendimento à Mulher e Núcleos.

A Central de Atendimento à Mulher – Ligue 180 orienta, acolhe e encaminha para os serviços da rede especializada, mulheres vítima de violência, além de receber denúncias. Só no período de janeiro a junho de 2012, foram registrados 388.953 atendimentos – em comparação com os seis primeiros meses de 2011, verifica-se um aumento de mais de 13% no total de registros. Do total das ligações do primeiro semestre de 2012, 47.555 registros foram feitos com relatos de violência. Entre os relatos dos primeiros meses de 2012, em 70,19% dos casos da violência doméstica contra a mulher, o agressor é o companheiro ou cônjuge da vítima. Acrescentando os demais vínculos afetivos (ex-marido, namorado e ex-namorado), esse dado sobe para 89,17% dos casos de violência contra a mulher.

(Fonte: - Assessoria de Comunicação Social - Secretaria de Políticas para as Mulheres – SPM - Presidência da República – PR)

Para informações, críticas, sugestões, envio de notícias, para anunciar, contate-nos.

Gurgel diz que bancos atrasam investigações do Ministério Público

Márcio Falcão

De Brasília

O procurador-geral da República, Roberto Gurgel, reforçou nesta terça-feira (12) as críticas aos bancos e acusou as instituições financeiras de atrasarem investigações do Ministério Público dificultando acesso a dados que deveriam ser disponibilizados imediatamente.

"Acho que todo sistema bancário precisa de ajuste", disse Gurgel na saída de um seminário promovido pelo CNJ (Conselho Nacional de Justiça) sobre lavagem de dinheiro.

Ontem, na abertura do evento, o presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Joaquim Barbosa, afirmou que, diante da sensação de impunidade, os bancos fazem um "controle leniente" de operações suspeitas, dificultando o combate ao crime de lavagem de dinheiro.

Gurgel afirmou que esse comportamento é visível não só em investigações que envolvem o crime de lavagem, mas em todos os casos penais.

"Sempre que precisamos das informações bancárias existe sim leniência das instituições financeiras no sentido de fornecer os dados. Normalmente, o atendimento é lento, precário. São necessárias três, quatro diligências complementares até que as informações cheguem como deveriam ter sido fornecidas no primeiro momento", disse.

Segundo ele, essa deficiência deve ser provocada pelo próprio sistema, mas é preciso trabalhar o aperfeiçoamento.

"Os bancos precisam sim aprimorar esse entendimento para que não sejam vistos eventualmente como coniventes com esse tipo de crime", completou.

Gurgel cobrou uma atuação mais forte do Banco Central, que é responsável por encaminhar aos demais bancos os pedidos de informações do Ministério Público Federal.

"É algo que depende do BC, que tem sido rigoroso e deve ser cada vez mais rigoroso e de cobrar das instituições bancárias ao atendimento dessas informações porque, afinal de contas, não estão fazendo favor, estão cumprindo a lei", afirmou.

Para ele, a legislação que trata de lavagem é "boa" e não precisa de aperfeiçoamento. A legislação desse crime foi alterada em 2012 numa tentativa de tornar mais eficiente o combate ao crime. Qualquer movimentação para ocultar recursos passou a ser caracterizada como infração penal, com penas de 3 a 10 anos de prisão. Antes, era preciso associar lavagem a outro crime antecedente, como tráfico de drogas.

Segundo ele, no entanto, "não basta que o Ministério Público tenha competência devida para formular as acusações, se o Judiciário não estiver preparado" para aplicar a legislação de forma "rigorosa e frequente".

Procurada, a Febraban (Federação Brasileira de Bancos) não comentou as declarações de Gurgel.

(Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/poder/1244792-gurgel-diz-que-bancos-atrasam-investigacoes-do-ministerio-publico.shtml, 11/03/2013)

Presidente do STF acusa bancos de serem 'lenientes' com lavagem de dinheiro

Márcio Falcão

De Brasília

O presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Joaquim Barbosa, acusou nesta segunda-feira os bancos de serem lenientes no controle que fazem para evitar o crime de lavagem de dinheiro. O motivo, segundo o ministro, é a sensação de impunidade.

Na avaliação de Barbosa, é preciso que as instituições financeiras sejam mais atuantes no combate a esse crime pela dificuldade de identificar a lavagem.

"De fato, enquanto instituições financeiras não visualizarem possibilidades de serem punidas por servirem de meio pela ocultação dos valores que se encontram sob sua responsabilidade, persistirá o estimulo à busca do lucro, visto como combustível ao controle leniente que os bancos fazem sobre abertura de contas e transferências", disse na abertura de um seminário sobre o combate à lavagem de dinheiro promovido pelo CNJ (Conselho Nacional de Justiça).

O presidente do STF disse ainda que houve avanços, mas que ainda é possível identificar um "quadro preocupante" no país sobre "branqueamento de capitais" e questionou a atuação dos tribunais na aplicação da legislação. Ele disse ainda que é preciso analisar se não há problemas de investigação do Ministério Público e das polícias.

De acordo com dados do CNJ, em 2012 a maioria dos tribunais julgou 15 processos relativos à lavagem de dinheiro, com exceção do Distrito Federal e de Goiás. Barbosa disse que "os procedimentos investigatórios em regra são arquivados, sendo exceções os que geram denúncias".

Como exemplo, Barbosa citou números de tribunais na primeira região, onde foram arquivados 83 inquéritos policiais, na segunda região, onde foram 49 arquivados, na terceira região (que inclui São Paulo), com 37 arquivamentos, na quarta região (155) e na quinta região (83).

Barbosa afirmou que é preciso analisar essa "diferença gritante" entre o número de denúncias apresentadas e as que de fato são acolhidas pelos órgãos do judiciário.

"O número de inquéritos arquivados, quando comparado ao número de denúncias aceitas, indica que é necessária apuração para saber se as discrepâncias estão na deficiência da investigação ou no trabalho executado pelo Ministério Público", afirmou.

São Paulo

O presidente do STF questionou o trabalho da Justiça de São Paulo se comparado com outros tribunais. No ano passado, enquanto São Paulo registrou 78 processos sobre lavagem de dinheiro em tramitação, Goiás, Distrito Federal, Ceará e Mato Grosso tiveram 852, 98, 89 e 84 respectivamente.

O levantamento do CNJ aponta ainda que "o Tribunal de Justiça de São também apresenta uma situação interessante, pois possui um número de procedimentos arquivados aproximadamente igual ao de denúncias". São Paulo tem hoje cinco varas especializadas em lavagem de dinheiro. Em 2011 e em 2012, não houve condenação no Estado por este crime.

Mudança na lei

Em julho do ano passado, a presidente Dilma Rousseff sancionou um projeto de lei que endurece o combate ao crime de lavagem.

A nova lei elimina crimes antecedentes. Antes, o crime de lavagem ocorria quando se ocultasse "a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens e valores" que tivessem origem em outros crimes, como tráfico de drogas. Agora o delito ocorre mesmo quando não estiver vinculado a outro crime.

O novo texto também aumenta a lista de entidades que devem informar ao Coaf movimentações financeiras suspeitas.

(Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/poder/1244210-presidente-do-stf-acusa-bancos-de-serem-lenientes-com-lavagem-de-dinheiro.shtml)

Polícia Federal multa 12 bancos em r$ 1,5 milhão por falhas na segurança

A Polícia Federal (PF) multou 12 bancos em R$ 1,573 milhão por falhas de segurança. A decisão foi anunciada durante a 95ª reunião da Comissão Consultiva para Assuntos de Segurança Privada (CCASP), em Brasília. A agência Vespasiano, da Caixa Econômica Federal, em Belo Horizonte, foi interditada. Os bancos foram punidos em processos abertos pelas delegacias estaduais de segurança privada (Delesp).

O Bradesco foi o banco mais multado, com R$ 682,8 mil, seguido do Banco do Brasil, Santander, Itaú Unibanco, HSBC e Caixa Econômica. As principais falhas apontadas foram agências e postos de atendimento com número insuficiente de vigilantes, planos de segurança não renovados, alarmes inoperantes, inauguração de agências sem aprovação de plano de segurança e cerceamento da fiscalização de policiais federais, dentre outras.

Houve ainda aplicação de penalidades contra empresas de segurança, vigilância e transporte de valores e cursos de formação de vigilantes. Foi a terceira e última reunião da CCASP em 2012.

A Comissão Consultiva para Assuntos de Segurança Privada é integrada por representantes do governo, trabalhadores e empresários. A Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf-CUT) representa os bancários. Já a Febraban é a porta-voz dos bancos. A reunião foi presidida pelo coordenador-geral de Controle de Segurança Privada (CGCSP) da Polícia Federal, delegado Clyton Eustáquio Xavier.

“Essas multas confirmam que os bancos tratam com negligência a segurança dos estabelecimentos”, diz Ademir Wiederkehr, representante da Contraf-CUT na CCASP e coordenador do Coletivo Nacional de Segurança Bancária.

Para o dirigente sindical, “recursos não faltam aos bancos para investir mais em segurança”. Segundo estudo do Dieese, os cinco maiores bancos do País lucraram R$ 36,3 bilhões nos primeiros nove meses de 2012. Já as despesas com segurança e vigilância somaram R$ 2,6 bilhões, o que representa uma média de 6,2% em comparação com o lucro.

“Além de mais investimentos dos bancos, esperamos que o Ministério da Justiça finalize o projeto de lei do estatuto de segurança privada, atualizando a lei federal nº 7.102/83, garantindo novos equipamentos de prevenção contra assaltos e sequestros e colocando a proteção da vida das pessoas em primeiro lugar”, afirma o dirigente da Contraf-CUT.

Veja o montante de multas por banco:

Bradesco – R$ 682.818,07

Banco do Brasil – R$ 282.361,06

Santander – R$ 154.659,48

Itaú Unibanco – R$ 122.376,82

HSBC – R$ 117.058,45

Caixa Econômica Federal – R$ 101.093,76

Banestes – R$ 37.245,63

Mercantil do Brasil – R$ 21.282,00

Safra – R$ 15.961,50

BNB – R$ 14.188,70

Sofisa – R$ 14.188,70

Banco da Amazônia – R$ 10.642,06

(Fonte: http://www.thebrazilianpost.com.br/policia-federal-multa-12-bancos-em-r-15-milhao-por-falhas-na-seguranca/)

PESQUISA:

Aplica-se o Código de Direitos de Consumidor na prestação de serviços?

Advogado: aplica o CDC

Código de Defesa do Consumidor. Incidência na relação entre advogado e cliente. Precedentes da Corte.

1. Ressalvada a posição do Relator, a Turma já decidiu pela incidência do Código de Defesa do Consumidor na relação entre advogado e cliente.

2. Recurso especial conhecido, mas desprovido.

(REsp 651278/RS, Rel. Ministro CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, TERCEIRA TURMA, julgado em 28.10.2004,

DJ 17.12.2004 p. 544, REPDJ 01.02.2005 p. 559)

Prestação de serviços advocatícios. Código de Defesa do Consumidor.

Aplicabilidade.

I - Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos serviços prestados por profissionais liberais, com as ressalvas nele contidas.

II - Caracterizada a sucumbência recíproca devem ser os ônus distribuídos conforme determina o art. 21do CPC.

III - Recursos especiais não conhecidos.

(REsp 364.168/SE, Rel. Ministro ANTÔNIO DE PÁDUA RIBEIRO, TERCEIRA TURMA, julgado em 20.04.2004, DJ 21.06.2004 p. 215)

RECURSO ESPECIAL - PREQUESTIONAMENTO - INOCORRÊNCIA- SÚMULA 282/STF - FALTA DE COMBATE AOS FUNDAMENTOS DO ACÓRDÃO - APLICAÇÃO ANALÓGICA DA SÚMULA 182 - DEFICIÊNCIA NA FUNDAMENTAÇÃO DO RECURSO - SÚMULA 284/STF - REPARAÇÃO DE DANOS - SERVIÇOS ADVOCATÍCIOS - PRESCRIÇÃO - TERMO INICIAL - RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA DOS SÓCIOS -LEGITIMIDADE PASSIVA - PRINCÍPIO DA ECONOMIA PROCESSUAL.

- Falta prequestionamento quando o dispositivo legal supostamente violado não foi discutido na formação do acórdão recorrido.

- É inviável o recurso especial que não ataca os fundamentos do acórdão recorrido. Inteligência da Súmula 182.

- Se o recorrente apenas cita artigo de lei federal, sem demonstrar a violação, incide a Súmula 284 do STF.

- A prescrição da ação para reparação por danos causados por advogado, em patrocínio judicial, flui do trânsito em julgado do provimento jurisdicional resultante do erro profissional apontado.

- A condição de responsável subsidiário (EOAB, Art.17) outorga legitimidade passiva a cada sócio de escritório de advocacia para responder ação de reparação por fato do serviço. O benefício da subsidiariedade só os protegem na execução.

- Não é compatível com o Princípio da Economia Processual forçar o autor, após longo e moroso processo de conhecimento e duma execução frustrada contra o devedor principal (sociedade advocatícia), novamente, a bater às portas do Judiciário para percorrer nova via crucis (enfadonha ação cognitiva além de outra execução), agora, contra os devedores subsidiários.

(REsp 645.662/SP, Rel. Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS, TERCEIRA TURMA, julgado em 28.06.2007, DJ 01.08.2007 p. 456)

Advogado: não aplica o CDC

"Processo Civil. Ação de conhecimento proposta por detentor de título executivo.

Admissibilidade.

Prestação de serviços advocatícios. Inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor.

O detentor de título executivo extrajudicial tem interesse para cobrá-lo pela via ordinária, o que enseja até situação menos gravosa para o devedor, pois dispensada a penhora, além de sua defesa poder ser exercida com maior amplitude.

Não há relação de consumo nos serviços prestados por advogados, seja por incidência de norma específica, no caso a Lei n° 8.906/94, seja por não ser atividade fornecida no mercado de consumo.

As prerrogativas e obrigações impostas aos advogados - como, v. g., a necessidade de manter sua independência em qualquer circunstância e a vedação à captação de causas ou à utilização de agenciador (arts. 31/ § 1° e 34/III e IV, da Lei n° 8.906/94) - evidenciam natureza incompatível coma atividade de consumo.

Recurso não conhecido."

(REsp 532377/RJ, Rel. Ministro CESAR ASFOR ROCHA, QUARTA TURMA, julgado em 21.08.2003, DJ 13.10.2003 p. 373)

"PROCESSUAL - AÇÃO DE ARBITRAMENTO DE HONORÁRIOS - PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS ADVOCATÍCIOS - CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR - NÃO APLICAÇÃO - CLÁUSULA ABUSIVA - PACTA SUNT SERVANDA.

- Não incide o CDC nos contratos de prestação de serviços advocatícios.

Portanto, não se pode considerar, simplesmente, abusiva a cláusula contratual que prevê honorários advocatícios em percentual superior ao usual. Prevalece a regra do pacta sunt servanda."

(REsp 757.867/RS, Rel. Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS, TERCEIRA TURMA, julgado em 21.09.2006, DJ 09.10.2006 p. 291)

(Fonte: http://www.professorallan.com.br/UserFiles/Arquivo/jurisprudencia_stj_temas_polemicos_na_defesa_do_consumidor.pdf, data de acesso 10/03/2013)

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

REsp 1150711 2009/0143715-5 Documento Página 1 de 19

RECURSO ESPECIAL Nº 1.150.711 - MG (2009/0143715-5)

EMENTA

CIVIL E CONSUMIDOR - AÇÃO DE REPARAÇÃO POR DANOS ADVINDOS DE DEFICIÊNCIA NA EXECUÇÃO DE MANDATO JUDICIAL – ASSISTÊNCIA JURÍDICA PRESTADA POR ADVOGADO INDICADO PELO SINDICATO A QUE

FILIADO O CLIENTE - CARACTERIZAÇÃO DE RELAÇÃO DE CONSUMO – COMPATIBILIDADE ENTRE O CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR E O ESTATUTO DA ADVOCACIA (LEI 8.906/94) - DIÁLOGO SISTEMÁTICO E

COORDENADO DAS FONTES LEGISLATIVAS PLÚRIMAS – PREVALÊNCIA DA INTERPRETAÇÃO CONCRETIZADORA DO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA DEFESA DO CONSUMIDOR - APLICAÇÃO DA REGRA PRESCRICIONAL

PREVISTA NO CDC (PRESCRIÇÃO QUINQUENAL).

1. A relação jurídica instaurada entre advogado (não empregado)e cliente/filiado do sindicato, tendo por objeto a prestação de serviços de assistência jurídica, encontra-se

regida pelo CDC, razão pela qual aplicável o prazo prescricional quinquenal para o exercício da pretensão à reparação pelos danos morais e materiais causados por alegada deficiência na execução de mandato judicial(artigo 27 do CDC).

2. O advogado não fica afastado da definição de "fornecedor de serviços", quando, no exercício autônomo da profissão, presta serviços advocatícios, remunerado por honorários, a um sujeito de direitos civil ou leigo, não profissional, cuja vulnerabilidade fática constitui presunção legal indicativa da relação jurídica de consumo.

3. Malgrado a existência de respeitáveis entendimento sem sentido contrário, é certo que a Lei 8.906/94 (Estatuto da Advocacia) e o CDC não se revelam incompatíveis. Isto porque o dever de independência do advogado (que, por vezes, deve agir em desconformidade com a vontade do próprio cliente) e a limitação à oferta/publicidade dos serviços prestados não têm o condão de desnaturar a relação jurídica de consumo instaurada com um consumidor. Tais deveres disciplinares apresentam o intuito de preservação da dignidade do exercício da advocacia (mister profissional essencial à Administração da Justiça), inibindo a "mercantilização" da atividade, o que, contudo, não afasta sua inserção no "mercado de consumo".

4. É que, à luz, principalmente, do artigo 4º, inciso I, do CDC, o mercado de consumo apresenta como traço distintivo a existência de um sujeito de direitos em situação de

vulnerabilidade em relação a um fornecedor de bens ou serviços, não restando, portanto, adstrito às operações mercantis, em que há oferta irrestrita de produtos ou serviços aos interessados e estímulo à concorrência.

5. Como consabido, o conteúdo da mens legis consumerista, fundada na norma constitucional que erigiu a defesa do consumidor como princípio inafastável, dirige-se à proteção da parte mais fraca da relação jurídica que apresenta como objeto o fornecimento de produtos ou de serviços, não importando qual seja a natureza do vínculo instaurado.

6. Ainda que assim não fosse, qualquer aparente antinomia entre as normas é solucionada, modernamente, com a observância da Teoria pós-moderna do Diálogo das Fontes, que viabiliza a aplicação simultânea, coerente e coordenada de fontes legislativas plúrimas convergentes, à luz dos valores e princípios albergados pela Constituição da República, afastando-se os métodos tradicionais e excludentes de

resolução de supostos conflitos normativos.

7. Deste modo, procedendo-se a um diálogo sistemático e coordenado entre o CDC, norma de caráter principiológico, e a Lei 8.906/94, com o escopo de viabilizar a concretização do mandamento constitucional de proteção do consumidor, sobressai a conclusão de que a prestação de serviço de advocacia subsume-se, sim, ao regime consumerista.

8. A advocacia, assim como outros serviços prestados por profissionais liberais de categorias diversas, é atividade privativa de pessoa devidamente habilitada perante a Ordem dos Advogados do Brasil (artigo 4º da Lei 8.906/94), não havendo, portanto, justificativa hábil para sua exclusão do rol de serviços oferecidos ao consumidor na atual sociedade de massa e de consumo.

9. Outrossim, verifica-se que as regras dispostas no Estatuto da Advocacia apresentam um caráter nitidamente ético-disciplinar do exercício da atividade profissional, regulando as pretensões advindas de interesses dos advogados, não estipulando normas específicas de proteção dos clientes frente a danos eventualmente produzidos com a atuação deficiente dos causídicos, o que corrobora a tese da incidência do CDC à

espécie.

10. Ademais, não se revela coerente afastar a prestação de serviços advocatícios do campo de incidência do CDC, mas, de outro lado, inserir atividades desenvolvidas por outros profissionais liberais cuja legislação própria também prevê o dever de independência profissional e a vedação da prática de publicidade atentatória à dignidade da profissão, a exemplo dos médicos e dos cirurgiões-dentistas.

11. Do mesmo modo, a existência de legislação própria reguladora do regime de concessão e permissão de prestação de serviços públicos (Lei 8.987/85), em que, muitas vezes, sequer se afigura possível a concorrência no mercado, jamais serviu de fundamento para afastamento da incidência da legislação consumerista.

12. No caso, a pretensão reparatória decorre de relação jurídica instaurada entre a advogada, indicada pelo sindicato, e o filiado, leigo e carente economicamente, tendo por objeto a prestação de serviços de assistência jurídica, razão pela qual se dessume a incidência das normas do CDC à espécie.

13. Assim, cuidando-se de pretensão de reparação decorrente de responsabilidade por fato do serviço (danos morais e patrimoniais advindos de suposta deficiência na execução de mandato judicial), revela-se aplicável a regra prescricional quinquenal prevista no artigo 27 do CDC, donde se dessume a higidez da pretensão deduzida em juízo pela cliente/consumidora.

14. Recurso especial desprovido, divergindo-se apenas do fundamento expendido pelo e. Ministro Relator.

VOTO-VISTA

O EXMO. SR. MINISTRO MARCO BUZZI: Cuida-se de recurso especial, fundado nas alíneas "a" e "c" do permissivo constitucional, interposto por MARIA DIMAIR FERREIRA FERRAZ, advogada ré nos autos de ação ordinária ajuizada por VILMA VIEIRA GRANDI, que pretende reparação por danos materiais e morais decorrentes de alegada deficiência na prestação de serviços advocatícios contratados por intermédio de sindicato.

O aresto recorrido cassou a sentença que acolhera a preliminar de prescrição trienal (artigo 206, § 3º, inciso V, do Código Civil de 2002), por considerar aplicável o prazo quinquenal previsto no artigo 27 do CDC. Eis o teor da ementa do referido julgado:

AÇÃO DE INDENIZAÇÃO - ADVOGADO - PROFISSIONAL LIBERAL -

RELAÇÃO DE CONSUMO - SINDICATO - PRESTAÇÃO DO SERVIÇO -

EQUIPARAÇÃO - PRETENSÃO REPARATÓRIA - PRESCRIÇÃO

QUINQUENAL - SENTENÇA CASSADA. A relação do profissional liberal com o seu cliente se exerce dentro do contexto do Código de Defesa do Consumidor. O sindicato, que oferece serviço de assistência jurídica aos seus sindicalizados, deve responder nos termos do Código de Defesa do Consumidor. Nas ações de indenização decorrentes de relação de consumo, deve incidir a prescrição quinquenal prevista na legislação Em suas razões, a recorrente aponta, além de divergência jurisprudencial,

ofensa aos artigos 206, § 3º, do Código Civil de 2002, 5º e 7º da Lei 8.906/94, ao argumento de que a relação jurídica advinda da prestação de serviços advocatícios não se subsume às regras do CDC, razão pela qual prescrita a pretensão de reparação civil deduzida após o prazo de três anos (prazo prescricional de direito comum).

Em síntese, o voto do e. Ministro Relator é no sentido de negar provimento ao recurso especial, mantendo-se a decisão dada no acórdão local, todavia, por fundamento diverso, tendo em vista que:

(i) o serviço de assistência jurídica ofertado pelo sindicato não se subsume às normas do CDC, por força da jurisprudência do STJ no sentido de haver regência legal própria para as relações derivadas de contrato de prestação de serviços de advocacia. Assim, a

prescrição da pretensão autoral não observa o prazo quinquenal previsto no artigo 27 do CDC;

(ii) o artigo 206, § 3º, inciso V, do Código Civil de 2002 (prazo prescricional trienal para exercício da pretensão de reparação civil) não se aplica à espécie, por se cingir aos casos de responsabilidade civil extracontratual; e

(iii) cuidando-se de ação de indenização do mandante em face do mandatário, em razão de suposto mau cumprimento do contrato de mandato, hipótese sem previsão legal específica, deve-se observar o prazo prescricional geral decenal (artigo 205 do Código Civil de 2002).

Pedi vista dos autos para melhor compreensão da controvérsia.

É o relatório.

Rogando vênia ao e. Ministro Relator, meu voto é no sentido de negar provimento ao recurso especial, mantendo-se o entendimento exarado no acórdão recorrido, por considerar que a relação jurídica instaurada entre advogado (não empregado)e cliente/filiado do sindicato, tendo por objeto a prestação de serviços de assistência jurídica, encontra-se regida pelo CDC, razão pela qual aplicável o prazo prescricional quinquenal para o exercício da pretensão à reparação pelos danos morais e materiais causados por alegada deficiência na execução de mandato judicial (artigo 27 do CDC).

Como consabido, a preocupação com a defesa do consumidor, considerada sua vulnerabilidade no mercado de consumo, à luz do princípio da Dignidade da pessoa humana (eficácia horizontal dos direitos fundamentais), restou manifestada em nível constitucional no inciso V do artigo 170 da Carta Magna, verbis:

Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurara todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:

(...)

V - defesa do consumidor;

(...)

Nesse contexto constitucional, sobreveio a Lei 8.078/1990 (Código de Defesa do Consumidor), que enumera normas de ordem pública e de interesse social voltadas para a proteção do elo mais fraco da relação de consumo, resgatando-o do poder abusivo dos detentores do poder econômico, intelectual, científico e tecnológico.

A definição, in concreto, do campo de incidência do CDC perpassa pela identificação da existência de relação jurídica de consumo, vale dizer, do vínculo jurídico, contratual ou extracontratual, instaurado entre um consumidor, sujeito de direitos em situação de vulnerabilidade legalmente presumida, e um profissional fornecedor de bens ou de serviços, como bem assinala Cláudia Lima Marques:

(...)

(...) o grande desafio do intérprete e aplicador do CDC, como Código que regula uma relação jurídica entre privados, é saber diferenciar e saber "ver" quem é comerciante, quem é civil, quem é consumidor, quem é fornecedor, quem faz parte da cadeia de produção e de distribuição e quem retira o bem do mercado como destinatário final, quem é equiparado a este, seja porque é uma coletividade que intervém na relação, porque é vítima de um acidente de consumo ou porque foi quem criou o risco no mercado. No caso do CDC é este exercício, de definir quem é o sujeito ou quem são os sujeitos da relação contratual e extracontratual, que vai definir o campo de aplicação desta lei, isto é, a que relações ela se aplica.

Como vimos, o diferente no CDC é seu campo de aplicação subjetiva (consumidor e fornecedor), seu campo de aplicação rationae personae, uma vez que materialmente ele se aplica em princípio a todas as relações contratuais e extracontratuais (campo de aplicação rationae materiae) entre consumidores e fornecedores.

E mais: a definição subjetiva neste novo direito privado solidário é relacional: assim um leigo, um civil frente a outro civil, será uma relação puramente de direito civil; o mesmo civil frente a um empresário, ou fornecedor, será uma relação de consumo; e este empresário ou profissional, talvez no mesmo tipo contratual de compra e venda, de transporte de coisas, de mandato, se frente a outro empresário ou profissional, será uma relação empresarial ou do antigo direito comercial. É um direito privado complexo, que diferencia subjetivamente para proteger os mais fracos, mas que valora a presença no outro pólo da relação contratual ou extracontratual de um sujeito leigo ou expert

(...).

(...)

Mister frisar mais uma vez que a figura do "consumidor" (um civil ou leigo) somente aparece frente a um "fornecedor" (um empresário ou profissional). O campo de aplicação do CDC ou a relação de consumo (contratual e extracontratual) é sempre entre um consumidor e um fornecedor, é um campo de aplicação relacional. Neste sentido, podemos afirmar que o próprio conceito de consumidor é um conceito relacional, conceito pensado constitucionalmente para uma relação entre diferentes, para a proteção dos diferentes. Isso porque um profissional dispõe de informações sobre o produto, sobre o serviço e sobre o contrato, é um expert, um profissional no assunto, é este

seu "ganha-pão", sua vocação, sua fonte de rendas, sua especialidade; já o outro na relação (o alter, o parceiro em um contrato ou vítima de um acidente de consumo), o consumidor, tem naturalmente um déficit informacional, é um leigo, ele e todos aqueles

que como ele formam a coletividade de consumidores afetados por aquela publicidade, produto transgênico, serviço financeiro complexo, etc.

(...) (In "Manual de Direito do Consumidor", obra em co-autoria com Antônio Herman V. Benjamin e Leonardo Roscoe Bessa, 2ª ed., Ed. Revista dos Tribunais, São Paulo, 2009, págs. 67/68)

Nessa senda, revela-se imprescindível a análise das normas dispostas nos artigos 2º, caput, 3º e 4º, inciso I, do CDC, verbis: Art. 2° Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.

(...)

Art. 3° Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.

§ 1° Produto é qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial.

§ 2° Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista.

Art. 4º A Política Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo, atendidos os seguintes princípios:

(Redação dada pela Lei nº 9.008, de 21.3.1995)

I - reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor no mercado de consumo;

Na esteira da corrente finalista ou teleológica, o "consumidor padrão" (também chamado de standard ou stricto sensu), definido no caput do artigo 2º do CDC como toda pessoa física ou jurídica que adquire produto ou utiliza serviço na condição de "destinatário final", restringe-se ao destinatário fático e econômico do produto ou serviço, ou seja, aquele que compra o produto ou contrata o serviço sem intuito lucrativo, objetivando a satisfação de necessidades próprias (ou de sua família ou dos que se lhe subordinam), sem a pretensão de fomentar o desenvolvimento de uma atividade negocial.

No particular, importante ressalvar a existência decorrente finalista aprofundada ou mitigada, no âmbito do STJ, que admite, excepcionalmente, a aplicação das normas do CDC a determinados consumidores profissionais, como pequenas empresas e profissionais liberais, desde que demonstrada sua vulnerabilidade em concreto. Ademais, não se pode olvidar a figura do "consumidor por equiparação" (terceiros-intervenientes, terceiros-vítimas e terceiros-expostos).

Sobre a definição de "fornecedor de produtos ou serviços", à luz do artigo 3º do CDC, abalizada doutrina ensina que:

(...) fornecedor é qualquer pessoa física, ou seja, qualquer um que, a título singular, mediante desempenho de atividade mercantil ou civil e de forma habitual, ofereça no mercado produtos ou serviços, e a jurídica, da mesma forma, mas em associação mercantil ou civil de forma habitual.

(...)

Quanto às atividades desempenhadas pelos fornecedores, são utilizados os termos "produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços", ou, em síntese, a condição de fornecedor está intimamente ligada à atividade de cada um e desde que

coloquem aqueles produtos e serviços efetivamente no mercado, nascendo daí, ipso facto, eventual responsabilidade por danos causados aos destinatários, ou seja, pelo fato do produto. (grifou-se) (José Geraldo Brito Filomeno, in "Código Brasileiro de Defesa do Consumidor: Comentado pelos Autores do Anteprojeto", Vol. I, 10ª ed., Ed.

Forense, Rio de Janeiro, 2011, pág. 52)

(...) A pretensão do legislador revela-se no sentido de ampliação do rol de agentes econômicos, destacadamente pelo fato de especificar a natureza dos sujeitos de direito, bem como pela indicação das atividades desenvolvidas no mercado de consumo.

Embora o dispositivo não utilize expressamente o termo "profissional" ou "profissionalmente", não se discute que o critério caracterizador é desenvolver atividades tipicamente profissionais, como a comercialização, a produção, a importação, indicando a necessidade de uma certa habitualidade, como a transformação, a distribuição de produtos.

Não importa a natureza da pessoa jurídica para fins de sua caracterização como fornecedora: pode ser sociedade civil, fundação, sociedade anônima, autarquia, empresa pública e até o próprio Estado. De fato, "qualquer sujeito de direito pode ser considerado fornecedor, desde que exerça atividade de fornecimento de produtos e serviços, no mercado de consumo, habitual ou profissionalmente". Até mesmo

"entes despersonalizados" podem, em tese, ser fornecedores.

Importante destacar que o CDC não exige, para configuração do fornecedor, a atuação no mercado com o objetivo de lucro: basta, quanto a este aspecto, que a atividade seja remunerada.

(...). (grifou-se) (Leonardo Rosco e Bessa, in "Relação de Consumo e Aplicação do Código de Defesa do Consumidor", 2ª ed., Ed. Revista dos Tribunais, São Paulo, 2009, págs. 88/89).

A definição legal de fornecedor foi elaborada para abranger a atividade de todos os agentes econômicos que introduzem produtos ou prestam serviço no mercado de consumo. A pretensão do legislador revela-se no sentido de ampliação do rol de agentes econômicos, destacadamente pelo fato de especificar a natureza jurídica dos sujeitos de

direito, bem como pela indicação das atividades desenvolvidas no mercado de consumo.

A pessoa física que introduz produtos ou presta serviços no mercado de consumo é considerada fornecedora.

(...)

A noção de pessoa jurídica como fornecedora é mais corrente. Em regra, a atividade econômica é desenvolvida pela pessoa jurídica, especialmente aquelas vinculadas ao campo de produção em sentido amplo. O Código de Defesa do Consumidor arrola, dentro da perspectiva de incluir todos os agentes econômicos na definição de fornecedor, as diversas espécies de pessoas jurídicas, ou seja a privada, a pública e,

inclusive, os entes despersonalizados.

(...)

Não há distinção na lei consumerista entre as variadas espécies de pessoas jurídicas fornecedoras, razão pela qual ao intérprete está vedada a interpretação restritiva. Assim, tanto a pessoa jurídica de natureza mercantil quanto a pessoa jurídica de natureza civil (associação, sociedade ou fundação) podem ser consideradas fornecedoras, desde que desenvolvam atividades alinhadas no art. 3º, caput, do CDC. (Héctor Valverde Santana, in "Dano Moral no Direito do Consumidor", Ed. Revista dos Tribunais, São Paulo, 2009, págs. 77/79).

Assim, a figura do "fornecedor", para fins de incidência do CDC, abrange amplo rol de agentes econômicos que desenvolvem atividades tipicamente profissionais, remuneradas direta ou indiretamente, ainda que desprovidas de intuito lucrativo, ressalvadas as atividades decorrentes de vínculo empregatício. O fornecedor é, portanto, todo aquele que, com habitualidade e mediante remuneração, propicia a oferta de produtos ou serviços a consumidores, sobressaindo a irrelevância da natureza civil ou empresarial da relação jurídica instaurada.

Sem considerar a divergência doutrinária existente quanto ao necessário caráter profissional do fornecedor, também se revela oportuna a transcrição da seguinte lição acerca das atividades que podem ser encartadas na expressão "fornecimento de serviços":

Quanto ao fornecimento de serviços, a definição do art. 3º do CDC foi mais concisa e, portanto, de interpretação mais aberta: menciona apenas o critério de desenvolver atividades de prestação de serviços. Mesmo o § 2º do art. 3º define serviço como "qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração", não especificando se o fornecedor necessita ser um profissional, bastando que esta atividade seja habitual ou reiterada. Segundo a doutrina brasileira, fornecer significa "prover, abastecer, guarnecer, dar, ministrar, facilitar, proporcionar" - trata-se, portanto, de uma atividade independente de quem realmente detém a propriedade dos eventuais bens utilizados para prestar o serviço e seus deveres anexos. A expressão "atividades", no caput do art. 3º, parece indicar a exigência de alguma reiteração ou habitualidade, mas fica clara a intenção do legislador de assegurar a inclusão de um grande número de prestadores de serviços no campo de aplicação do CDC, à dependência única de ser o co-contratante um consumidor. Sendo que, como serviço, o § 2º do art. 3º, entende também as atividades de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, ficando excluídas apenas as de caráter trabalhista. (grifou-se). (Cláudia Lima Marques, in

"Manual de Direito do Consumidor", 2ª ed., Ed. Revista dos Tribunais, São Paulo, 2009, pág. 82)

O fornecimento de serviços, portanto, abrange qualquer atividade desenvolvida no mercado de consumo mediante remuneração (direta ou indireta), inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, ressalvadas as atividades decorrentes de relações de caráter trabalhista.

Nessa ordem de ideias, não resta dúvida de que os serviços prestados por profissional liberal a pessoas que ostentam o caráter de consumidores, mediante remuneração direta ou indireta, encerram típica relação de consumo, inferência corroborada, inclusive, pela norma inserta no § 4º do artigo 14 do CDC, segundo a qual:

Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.

(...)

§ 4° A responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será apurada mediante a verificação de culpa. (grifou-se)

A proposição acerca do enquadramento do profissional liberal no conceito de fornecedor de serviços, para fins de incidência do CDC, encontra respaldo na doutrina:

Considera-se profissional liberal aquela pessoa que exerce atividade especializada de prestação de serviços de natureza predominantemente intelectual e técnica, normalmente com formação universitária, em caráter permanente e autônomo, sem qualquer vínculo de subordinação. Benjamin sintetiza numa frase a caracterização, afirmando: "por profissional liberal há que se entender o prestador de serviço solitário, que faz do seu conhecimento uma ferramenta de sobrevivência".

(...)

O profissional liberal celebra, normalmente, com seu cliente um contrato de prestação de serviços em que prepondera o elemento confiança (intuitu personae). Na categoria dos profissionais liberais, incluem-se médicos, dentistas, advogados, engenheiros, arquitetos, psicólogos, veterinários, agrônomos, farmacêuticos, fisioterapeutas, fonoaudiólogos, economistas, contabilistas, administradores, enfermeiros, professores, etc.

Guardadas as peculiaridades de cada atividade, podem-se apontar as características comuns das profissionais liberais:

a) prestação de serviços técnicos ou científicos especializados; b) formação técnica especializada, normalmente em nível universitário;

c) vínculo de confiança com o cliente (intuitu personae);

d) ausência de vínculo de subordinação com o cliente ou com terceiro;

e) exercício permanente da profissão.

A relação entre o profissional liberal (fornecedor de serviços) e o seu cliente (consumidor) nasce, em regra, de um contrato de prestação de serviços. Por isso, a sua responsabilidade tem natureza predominantemente contratual. Às vezes, pode apresentar natureza extracontratual, como na hipótese do médico que é obrigado a atender em caráter de urgência, uma pessoa desconhecida na rua que apresenta grave problema de saúde. Semelhante é a situação do advogado dativo designado pelo juiz para defesa do réu pobre.

(grifou-se) (Paulo de Tarso Vieira Sanseverino, in "Responsabilidade Civil no Código do Consumidor e a Defesa do Fornecedor", 3ª ed., Ed. Saraiva, São Paulo, 2010, págs. 197/199)

O profissional liberal, entendido como a pessoa física dotada de qualificação especial para prestar determinado serviço de natureza personalíssima, mediante o prévio cumprimento das condições impostas por lei, a exemplo do advogado, médico, odontólogo, nutricionista, psicólogo, engenheiro, dentre outros, submete-se ao Código de Defesa do Consumidor na condição de fornecedor, porém com perquirição de culpa na configuração de sua responsabilidade civil, nos termos do art. 14, § 4º, do CDC. (grifou-se) (Héctor Valverde Santana, in obra citada, pág. 77).

Por profissional liberal há que se entender o prestador de serviço solitário, que faz do seu conhecimento uma ferramenta de sobrevivência. É o médico, o engenheiro, o arquiteto, o dentista, o advogado. Trata-se, por outro lado, de categorias em franco declínio, na exata proporção em que, mais e mais, tais profissionais tendem a se

agrupar em torno de empresas prestadoras de serviços: os hospitais, os grupos de saúde, as empresas de engenharia e de consultoria, as sociedades de advogados. (Antônio Herman V. Benjamin, in "Manual de Direito do Consumidor", obra em co-autoria com Cláudia Lima Marques e Leonardo Rosco e Bessa, 2ª ed., Ed. Revista dos Tribunais, São Paulo, 2009, págs. 67/68)

Desta sorte, as atividades de natureza técnico-científica desenvolvidas por profissionais liberais, mediante remuneração, inserem-se na definição de fornecimento de serviços, à luz do disposto no artigo 3º, caput e § 2º, do CDC.

A tese da aplicação do CDC aos serviços prestados por profissionais liberais é encampada pela jurisprudência desta Corte:

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR AOS SERVIÇOS PRESTADOS POR PROFISSIONAIS LIBERAIS.

1-Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos serviços prestados por profissionais liberais, inclusive no que tange ao prazo prescricional quinquenal previsto no seu artigo 27.Precedentes.

2-- Não há motivos para retratação em Decisão firmada com base em jurisprudência consolidada desta Corte, bem como doSupremo Tribunal Federal. Agravo Regimental improvido. (AgRg no REsp 1.067.194/SP, Rel. Ministro Sidnei Beneti, Terceira Turma, julgado em 16.12.2008, DJe 11.02.2009)

RECURSO ESPECIAL. ERRO MÉDICO. CIRURGIÃO PLÁSTICO.

PROFISSIONAL LIBERAL. APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. PRECEDENTES.

PRESCRIÇÃO CONSUMERISTA.

I - Conforme precedentes firmados pelas turmas que compõem a Segunda Seção, é de se aplicar o Código de Defesa do Consumidor aos serviços prestados pelos profissionais liberais, com as ressalvas do § 4º do artigo 14.

II - O fato de se exigir comprovação da culpa para poder responsabilizar o profissional liberal pelos serviços prestados de forma inadequada, não é motivo suficiente para afastar a regra de prescrição estabelecida no artigo 27 da legislação consumerista, que é especial em relação às normas contidas no Código Civil. Recurso especial não conhecido. (REsp 731.078/SP, Rel. Ministro Castro Filho, Terceira Turma, julgado em

13.12.2005, DJ 13.02.2006)

Prestação de serviços advocatícios. Código de Defesa do Consumidor.

Aplicabilidade.

I - Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos serviços prestados por profissionais liberais, com as ressalvas nele contidas.

II - Caracterizada a sucumbência recíproca devem ser os ônus distribuídos conforme determina o art. 21 do CPC.

III - Recursos especiais não conhecidos. (REsp 364.168/SE, Rel. Ministro Antônio de Pádua Ribeiro, Terceira Turma, julgado em 20.04.2004, DJ 21.06.2004) Nessa senda, o advogado que, no exercício autônomo da profissão, presta serviços advocatícios, remunerado por honorários, não fica afastado da definição de "fornecedor de serviços", máxime quando contrata com sujeito civil ou leigo, não profissional, cuja vulnerabilidade fática constitui presunção legal indicativa da relação jurídica de consumo. Assim, a prestação de serviços de advocacia pelo profissional liberal caracteriza fornecimento de serviços no mercado de consumo, inserindo-se, portanto, no campo de incidência do CDC.

No mesmo sentido, destaca-se a seguinte lição doutrinária da lavra de um dos autores do anteprojeto do CDC:

(...) o advogado autônomo, liberal, sem vínculo empregatício, obviamente exerce atividade ou serviços especialíssimos, em prol de seu cliente e, por conseguinte, está inserido na categoria "fornecedor de serviços", com a ressalva de que, em termos de responsabilização por eventuais danos causados aos clientes - consumidores, sem dúvida, de seus serviços - somente responderá por culpa demonstrada, e não objetivamente, como outros fornecedores, já que exercem "atividade de risco".

(...)

Entre o consumidor, de um lado, e seu advogado, de outro, há, sem dúvida, relação de consumo, e a justiça competente para julgar eventuais danos causados ao primeiro, é a Justiça Ordinária, como em qualquer outro tipo de contrato, nesse caso, o de prestação de serviços.

(...)

Assim, por exemplo, caso haja imprudência, negligência ou imperícia do advogado, e, sobretudo dolo, de modo a causar prejuízos ao seu cliente/consumidor, cuida-se, sem dúvida alguma, de relações de consumo, e não de trabalho. (José Geraldo Brito

Filomeno, in "Código Brasileiro de Defesa do Consumidor Comentado pelos Autores do Anteprojeto", Volume I, 10ª ed., Ed. Forense, Rio de Janeiro, 2011, págs. 69/70).

Nada obstante, há julgados oriundos das Turmas de Direito Privado no sentido de não restar configurada relação de consumo nos serviços prestados por advogados, seja por incidência de norma específica (Lei 8.906/94), seja por não ser atividade fornecida no mercado de consumo (REsp 1.123.422/PR, Rel. Ministro João Otávio de Noronha, Quarta Turma, julgado em 04.08.2011, DJe 15.08.2011; AgRg no Ag 1.380.692/SC, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 24.05.2011, DJe 30.05.2011; REsp 1.134.889/PE, Rel. Ministro Honildo Amaral de Mello Castro (Desembargador Convocado do TJ/AP), Quarta Turma, julgado em 23.03.2010, DJe 08.04.2010; REsp 914.105/GO, Rel. Ministro Fernando Gonçalves, Quarta Turma, julgado em 09.09.2008, DJe 22.09.2008; REsp 539.077/MS, Rel. Ministro Aldir Passarinho Júnior, Quarta Turma, julgado em 26.04.2005, DJ 30.05.2005; REsp 532.377/RJ, Rel. Ministro Cesar Asfor Rocha, Quarta Turma, julgado em 21.08.2003, DJ 13.10.2003).

A referida jurisprudência baseia-se nas seguintes premissas:

(i) ainda que o exercício da nobre profissão de advogado possa importar, eventualmente e em certo aspecto, espécie do gênero prestação de serviço, é ele regido por norma especial, que regula a relação entre cliente e advogado, além de dispor sobre os respectivos honorários, afastando a incidência de norma geral.

(ii) as prerrogativas e obrigações impostas aos advogados, como a necessidade de manter sua independência em qualquer circunstância e a vedação à captação de causas ou à utilização de agenciador (artigos 31, § 1º, e 34, incisos III e IV, da Lei 8.906/94),

evidenciam natureza incompatível com a atividade de consumo.

A fim de refutar as aludidas premissas, cumpre, inicialmente, transcrever o teor dos artigos 31, § 1º, e 34, incisos III e IV, da Lei 8.906/94(Estatuto da Advocacia e a Ordem dos Advogados do Brasil), que, supostamente, incompatibilizam a incidência do CDC à prestação de serviços advocatícios:

CAPÍTULO VIII

Da Ética do Advogado

Art. 31. O advogado deve proceder de forma que o torne merecedor de respeito e que contribua para o prestígio da classe e da advocacia.

§ 1º O advogado, no exercício da profissão, deve manter independência em qualquer circunstância.

(...)

CAPÍTULO IX

Das Infrações e Sanções Disciplinares

Art. 34. Constitui infração disciplinar:

(...)

III - valer-se de agenciador de causas, mediante participação nos honorários a receber;

IV - angariar ou captar causas, com ou sem a intervenção de terceiros;

(...)

Acerca do dever de independência do advogado, previsto no § 1º do artigo 31 da Lei 8.906/94, esclarece Paulo Lôbo:

A independência é um dos mais caros pressupostos da advocacia. Sem ela não há rigorosamente advocacia. Qualquer pessoa apenas confiará na justiça se contar com a assistência de um defensor independente. A independência do advogado não se limita a sua atividade judicial; é também essencial à atividade extrajudicial de consultoria e assessoria, assim como importante fator de preservação do Estado de Direito, do governo submetido a leis, da contenção do abuso da autoridade e da limitação do poder econômico, porque foi instituída no interesse de todos os cidadãos, da sociedade e do próprio Estado. (...)

A independência do advogado está estreitamente ligada à independência da Ordem, que não se vincula nem se subordina a qualquer poder estatal, econômico ou político. (...)

A independência do advogado é condição necessária para o regular funcionamento do Estado de Direito.

(...)

Na defesa dos interesses sob seu patrocínio, o advogado nunca deve fazer concessões a sua independência, inclusive em face do próprio cliente. Na escolha dos meios jurídicos e na condução de seu trabalho profissional, o advogado nunca deve permitir que haja tutela direta ou indireta do cliente, de terceiro ou do magistrado. É sua, inteira e indelegável, a responsabilidade pela direção técnica da causa ou da questão.

(...)

A ética do advogado é a ética da parcialidade, ao contrário da ética do juiz, que é a da isenção. Contudo, não pode o advogado cobrir com o manto ético qualquer interesse do cliente, cabendo-lhe recusar o patrocínio que viole sua independência ou a ética profissional. Não há justificativa ética, salvo no campo da defesa criminal, para a cegueira dos valores diante da defesa de interesses sabidamente aéticos ou de origem

ilícita. A recusa, nesses casos, é um imperativo que engrandece o advogado.

(...) (grifou-se) (In "Comentários ao Estatuto da Advocacia e da OAB", 4ª ed., Ed. Saraiva, São Paulo, 2007, págs. 184/187)

Quanto à vedação de utilização de agenciador e da captação de causas, infrações disciplinares que, segundo a jurisprudência desta Corte, tornariam incompatível o exercício da advocacia com o fornecimento de serviços no mercado de consumo, assinala Flávio Olímpio de Azevedo:

80. VALER-SE DE AGENCIADOR DE CAUSAS (III)

Comete infração disciplinar e ética o advogado que arregimenta agenciadores, conhecidos popularmente como paqueiros, objetivando o encaminhamento de causas aos advogados mediante participação nos honorários advocatícios.

Gisela Gondin Ramos bem define a figura do intermediário da causa:

"Agenciador é aquele que encaminha negócios para outrem, sendo remunerado com uma percentagem sobre este mesmo negócio. O Estatuto rechaça de forma expressa este tipo de intermediação, porquanto atenta contra a dignidade da advocacia. (...)".

(...)

81. ANGARIAR OU CAPTAR CAUSAS (IV)

A publicidade imoderada é motivo principal da transgressão disciplinar do inciso IV. É por intermédio dela que o advogado expressa a conduta antiética de mercantilização de sua profissão como meio indevido de captação de clientela. Dá-se por propaganda direta e indireta, a exemplo de uma matéria jornalística repleta de autopromoção do advogado, exaltando sua figura e, no fim, fornecendo aos leitores seu nome e telefone.

(...) (grifou-se) (In"Comentários ao Estatuto da Advocacia:

Jurisprudência da OAB, Código de Ética e Disciplina, Regulamento da Advocacia", 2ª ed., Ed. Elsevier, Rio de Janeiro, 2010, pág. 149)

Nesse contexto, não se vislumbra qualquer incompatibilidade entre a Lei 8.906/94 e o CDC. Isto porque o dever de independência do advogado (que, por vezes, deverá agir em desconformidade com a vontade do próprio cliente) e a limitação à oferta/publicidade dos serviços prestados não têm o condão de desnaturar a relação jurídica de consumo instaurada com um consumidor. Tais deveres disciplinares apresentam o intuito de preservação da dignidade do exercício da advocacia (mister profissional essencial à Administração da Justiça), inibindo a "mercantilização" da atividade, o que, contudo, não afasta sua inserção no "mercado de consumo".

Com efeito, abalizada doutrina, ao versar sobre o conceito de "mercado de consumo", assevera que:

(...) o mercado é o ambiente e as atividades relativas ao processo econômico, profissional e remunerado, de produção, distribuição e comercialização de produtos e de prestação de serviços ou, como destacou o Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira no julgamento do REsp 213.799, sucessão de etapas, no âmbito da sociedade industrial, "ligadas aos bens, desde sua produção até a utilização final".

O CDC, ao se referir a mercado de consumo (art. 3º, § 2º, art. 4º, I e II, c), deseja destacar que sua tutela se dirige, de regra, ao ponto final da cadeia econômica de produção e circulação de bens e prestação de serviços. Deseja secundariamente indicar que não se trata também de disciplina de outras áreas, como por exemplo, do mercado de trabalho.

(Leonardo Roscoe Bessa, in "Relação de Consumo e Aplicação do Código de Defesa do Consumidor", 2ª ed., Ed. Revista dos Tribunais, São Paulo, 2009, pág. 95).

Assim, sobressai a inferência de que, à luz, principalmente, do artigo 4º, inciso I, do CDC, o mercado de consumo apresenta como traço distintivo a existência de um sujeito de direitos em situação de vulnerabilidade em relação a um fornecedor de bens ou serviços, não restando, portanto, adstrito às operações mercantis, em que há oferta irrestrita de produtos ou serviços aos interessados e estímulo à concorrência.

É que o conteúdo da mens legis consumerista, fundada na norma constitucional que erigiu a defesa do consumidor como princípio inafastável, dirige-se à proteção da parte mais fraca da relação jurídica que apresenta como objeto o fornecimento de produtos ou de serviços, não importando qual seja a natureza do vínculo instaurado.

Para corroborar a aludida tese, importante destacar o seguinte trecho de obra da lavra de Cláudia Lima Marques, no sentido de que:

Atualmente, denominam-se contratos de consumo todas aquelas relações contratuais ligando um consumidor a um profissional, fornecedor de bens e de serviços. Essa terminologia tem como mérito englobar todos os contratos civis e mesmo mercantis, nos quais, por estar presente em um dos polos da relação um consumidor, existe um provável desequilíbrio entre os contratantes. Esse desequilíbrio estrutural teria reflexos no conteúdo do contrato, daí nascendo a necessidade de o direito regular estas relações contratuais de maneira a assegurar o justo equilíbrio dos direitos e obrigações das partes, harmonizando as forças do contrato através de uma regulamentação especial.

Em outras palavras, o direito privado brasileiro atual é tripartite. O direito privado, garantido e moldado pela ordem pública constitucional, limitado e construído pela eficácia dos direitos fundamentais aí recebidos, divide-se em três partes: em um direito geral, o direito civil, e dois direitos especiais, o direito comercial ou direito de empresa, voltado para as relações entre empresas e fornecedores, e o direito do consumidor, voltado para a proteção deste sujeito mais débil ou vulnerável, o consumidor. O Código Civil de 2002 unificou as obrigações civis e empresariais; já o Código de Defesa do Consumidor se especializou em regular todas as relações de consumo.

(...)

Do exame dos arts. 2º e 3º do CDC, que definem os agentes contratuais, consumidor e fornecedor de produtos ou serviços, podemos concluir que as normas do Código estabelecem um novo regime legal para todas as espécies de contratos (exceto os trabalhistas) envolvendo consumidores e fornecedores de bens ou serviços, não importando se existe lei específica para regulá-los (como o contrato de seguro-saúde), pois as norma de ordem pública (art. 1º) estabelecem parâmetros mínimos de boa-fé e transparência a serem seguidos obrigatoriamente no mercado brasileiro.

São os contratos agora denominados de consumo, sejam eles de compra e venda, de consórcio, de depósito, de abertura de conta corrente, de prestação de serviços profissionais, de empréstimo, de financiamento ou de alienação fiduciária, de transporte, de seguro, de seguro-saúde, só para citar os mais comuns. (In“Contratos no Código de Defesa do Consumidor: O Novo Regime das Relações Contratuais”, 6ª ed., Ed.

Revista dos Tribunais, São Paulo, 2011, págs. 300 e447/448) Nessa senda, a expressão "mercado de consumo", nos termos do CDC, abrange, inclusive, atividades civis desenvolvidas por fornecedores em relação a um consumidor, não se restringindo, portanto, ao desenvolvimento de atividades mercantis, razão pela qual se infere que a limitação à forma de publicidade e oferta dos serviços a serem prestados não retira o advogado do alcance do sistema de proteção consumerista.

A advocacia, assim como outros serviços prestados por profissionais liberais de categorias diversas, é atividade privativa de pessoa devidamente habilitada perante a Ordem dos Advogados do Brasil (artigo 4º da Lei 8.906/94), não havendo, portanto, justificativa hábil para sua exclusão do rol de serviços oferecidos ao consumidor na atual sociedade de massa.

Oportuna a observação de Leonardo Roscoe Bessa, promotor de justiça titular da 2ª Promotoria de Defesa do Consumidor do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios – MPDFT:

O Superior Tribunal de Justiça, contrariando a doutrina majoritária sobre o tema, possui entendimento que não há relação de consumo entre cliente e escritório de advocacia. Todavia, independentemente da incidência do Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90) ao caso, fato é que tanto o Código Civil como o próprio Estatuto da Advocacia exigem do profissional conduta leal, honesta, e transparente com o seu

cliente.

Por se tratar de obrigação de meio, entende-se que apenas uma atuação evidentemente desidiosa pode gerar a obrigação de indenizar o cliente/consumidor. A indenização, no caso, deve ser pleiteada na Justiça, além da possibilidade de representação disciplinar perante a OAB.

(Direitos do consumidor. Correio Braziliense, Brasília, 5 dez. 2011. Direito & Justiça, p. 6)

Ainda que assim não fosse, é certo que, hodiernamente, a aparente antinomia entre normas pode ser solucionada com a observância da Teoria pós-moderna do Diálogo das Fontes, a fim de viabilizar a aplicação simultânea, coerente e coordenada das fontes legislativas convergentes, à luz dos valores e princípios albergados pela Constituição da República, afastando-se os métodos tradicionais e excludentes de resolução de supostos conflitos normativos.

Deste modo, impõe-se a realização de diálogo sistemático e coordenado entre o CDC (norma de caráter principiológico) e a Lei 8.906/94, com o escopo de viabilizar a concretização do mandamento constitucional de proteção do consumidor, fixando-se o normativo regente da responsabilidade do advogado por dano causado ao cliente.

Com efeito, os artigos 32 e 34, inciso XXIV, da Lei8.906/94, preceituam que:

Art. 32. O advogado é responsável pelos atos que, no exercício profissional, praticar com dolo ou culpa.

Parágrafo único. Em caso de lide temerária, o advogado será solidariamente responsável com seu cliente, desde que coligado com este para lesar a parte contrária, o que será apurado em ação própria.

Art. 34. Constitui infração disciplinar:

(...)

XXIV - incidir em erros reiterados que evidenciem inépcia profissional;

(...)

Das análise das aludidas normas estatutárias (entre outras), verifica-se que as regras dispostas na Lei 8.906/94 apresentam um caráter nitidamente ético-disciplinar do exercício da atividade profissional, regulando as pretensões advindas de interesses dos advogados, não estipulando normas específicas de proteção dos clientes frente a danos eventualmente produzidos com a atuação deficiente dos causídicos, o que corrobora a tese da incidência do CDC à espécie.

Ademais, não se revela coerente afastar a prestação de serviços advocatícios do campo de incidência do CDC, mas, de outro lado, inserir atividades desenvolvidas por outros profissionais liberais cuja legislação própria também prevê o dever de independência profissional e a vedação da prática de publicidade atentatória à dignidade da profissão.

É o que ocorre, por exemplo, com a profissão de médico, cujas atividades são consideradas objeto de relação de consumo pela jurisprudência do STJ, malgrado a existência de normativo próprio (Lei 3.268/57 e Código de Ética Médica) que impõe o resguardo da autonomia, independência e liberdade profissional e proíbe o exercício da medicina como comércio.

O mesmo raciocínio aplica-se à prestação de serviços de odontologia, regulada pela Lei 5.081/1966, que veda, ao cirurgião-dentista, a exposição em público de trabalhos odontológicos e o uso de artifícios de publicidade para granjear clientela, bem como o anúncio de preços de serviços, de modalidades de pagamento e de outras formas de comercialização da clínica que signifiquem competição desleal (artigo 7º).

Do mesmo modo, a existência de legislação própria reguladora do regime de concessão e permissão de prestação de serviços públicos (Lei 8.987/85), em que, muitas vezes, sequer se afigura possível a concorrência no mercado, nunca serviu de fundamento para afastamento da incidência da legislação consumerista.

No caso, a pretensão reparatória decorre de relação jurídica instaurada entre a advogada, indicada pelo sindicato, e o filiado, leigo e carente economicamente, tendo por objeto a prestação de serviços de assistência jurídica, razão pela qual se dessume a incidência das normas do CDC à espécie.

Assim, cuidando-se de pretensão de reparação decorrente de responsabilidade por fato do serviço (danos morais e patrimoniais advindos de suposta deficiência na execução de mandato judicial), revela-se aplicável a regra prescricional quinquenal prevista no artigo 27 do CDC, verbis:

Art. 27. Prescreve em cinco anos a pretensão à reparação pelos danos causados por fato do produto ou do serviço prevista na Seção II deste Capítulo, iniciando-se a contagem do prazo a partir do conhecimento do dano e de sua autoria.

Na hipótese em foco, restou assente na origem que o termo inicial do prazo prescricional ocorreu em 23.05.2002, com a ciência pela consumidora do suposto prejuízo advindo do acordo celebrado nos autos da reclamação trabalhista individual, não se vislumbrando, portanto, a prescrição da pretensão de reparação deduzida em 24.04.2007, dirigida contra o sindicato e a advogada prestadora da assistência jurídica.

Do exposto, divergindo do e. Ministro Relator apenas quanto ao fundamento expendido em seu voto, acompanho-o negando provimento ao recurso especial. É como voto.

REsp 1150711 2009/0143715-5 Documento Página 19 de 19

(Fonte: http://www.conjur.com.br/dl/voto-ministro-buzzi-cdc-advogado.pdf, data de acesso em 12/03/2013)